terça-feira, 17 de maio de 2016

O QUE QUEREMOS DA VIDA


“Não te beijo e tenho ensejo/Para um beijo te roubar;/O beijo mata o desejo/E eu quero-te desejar.”
António Fernandes Aleixo

Sandra Freire
Delegamos a outrem a imensa responsabilidade de sermos felizes. Sonhamos, buscamos, esperamos por alguém para quem sejamos o universo. Não queremos menos, queremos ser o “tudo” para alguém. E esse alguém tem de preencher todas as nossas lacunas, aceitar nossas imperfeições, nos amar incondicionalmente. Queremos seus olhos só para nós e em suas palavras, só elogios. Queremos o amor pleno, o sexo perfeito, mãos trêmulas ao nos tocar. Sem esse outro, não somos capazes de ser felizes. Somos incompletos, nos falta o outro como se nos faltasse uma parte do corpo.

Sequer vemos a natureza com as mesmas cores de quando estamos apaixonados. A simples ilusão de ter encontrado a “outra metade”, faz com que o verde da paisagem, as flores, a música, sejam diferentes do que sempre foram. A vida adquire novo brilho, mais vivo. O que sempre esteve ali parece ter sido recriado para o nosso deslumbre.

Queremos, queremos queremos...
O que fazemos para ter, se nem ao menos sabemos reconhecer o que a vida nos dá? Se temos isso, queremos aquilo. Quando temos aquilo, queremos aqueloutro.

O que queremos da vida? Tudo o que ela nos deu, enquanto buscávamos longe o que estava tão perto.

Queremos tão somente querer. Desejo e felicidade não andam juntos. Desejamos ter para alcançar a felicidade. Quando temos desprezamos, para continuar buscando. O desejo é cobiça. Nesse percurso de busca, encontro e descarte, Rubem Alves nos chama a atenção para “A felicidade é simples. Às vezes, sequer a vemos passar, tal a sua simplicidade”


O PENSAMENTO VOA...


“O pensamento positivo pode vir naturalmente para alguns, mas também pode ser aprendido e cultivado, mude seus pensamentos e você mudará seu mundo.”
                                                                                          Norman Vincent Peale

Sandra Freire
Ele é nosso. Só nosso, pessoal e intransferível. Está conosco o tempo todo. Não tem peso ao ser levado junto, mas pode pesar tanto a ponto de nos incapacitar. Traz em si as chaves da felicidade, tristeza, alegria, angústia, esperança, fé, conformação, desespero e paz. Não dita regras, obedece. Deixar o pensamento voar é exercitar a liberdade.

Longe do ser amado, nos ocorre que ele possa estar em outros braços. Pensando, seduzindo e até desejando alguém. Sofremos.  E, sofremos porque queremos. Por que não imaginar que ele possa estar pensando em nós e desejando o mesmo – estarmos juntos? Aí então, só felicidade!

Mesmo quando se quer muito ter algo ou alguém, a certeza de conseguir tem como pano de fundo a dúvida.

Quando um filho (a) não volta numa hora plausível, começamos a pensar que algo grave possa ter ocorrido. Que angústia! Por que então não usar a chave da fé e esperar que ele (a) adentre feliz da vida por ter estado num programinha que fez valer o atraso – o que justifica o celular fora de área?

Quando nossa mãe dá uma sumida, vem logo a preocupação de um mal súbito, uma queda ou algo incapacitante. A apreensão embota o pensamento. Não dá para imaginar que algo bom e diferente do usual possa ter ocorrido? O telefone na bolsa de quem já deixou um tanto da audição pela vida afora, não ajuda muito.

Se uma criança se esconde, o pavor de que tenha caído da janela ou sido levada por alguém e que coisas horríveis estejam acontecendo, nos tira o ar, que desespero! Melhor exercitar a paciência e a memória, revendo o que se fazia nessa mesma fase da infância.

Como o músculo da memória anda meio flácido, mudar coisas de lugar pode significar perda. Mas, o que se pensa é que aquela coisa possa ter sido subtraída por outro ou mesmo tenha ido parar no lixo. Um exercício útil até para a cabeça que anda meio fora do ar, é refazer os passos a partir do último contato com o objeto em questão. Ou, se não houver premência do mesmo, deixe passar. Um dia, ele ressurge.

Apesar de as chaves estarem à disposição para serem utilizadas na ordem certa, quase sempre o são no sentido de gerar incerteza, sofrimento etc. É fato que o poeta é maior na tristeza do que na alegria e que artistas e intelectuais com seus nomes na história, tiveram suas vidas divulgadas pelo viés contrário ao da felicidade. Pra lá de sabido, felicidade não atrai tanto interesse quanto desgraça.


Nosso chaveiro vem completo. Como usá-lo, só depende de nós.