quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

O BAÚ




O BAÚ
Não remexa no passado, se não quiser que ele mexa com você.
Toda casa tinha um baú. Nele eram guardados coisas em desuso; fotografias, roupas, fantasias, peças de mobiliário etc. Quando surgia uma ocasião propícia, o baú era visitado.
Com o tempo, o baú foi perdendo interesse e relegado ao sótão, quarto da avó ou algum canto onde incomodasse menos, caiu no esquecimento.
As casas foram sendo substituídas por apartamentos. Os apartamentos foram encolhendo e os baús sendo trocados por caixas. As fotos foram deixando de ser impressas e não é mais preciso um lugar físico; as roupas, por falta de espaço ou de interesse, foram sendo descartadas; as cartas, não mais escritas em papel, vão-se perdendo em meio ao lixo eletrônico; as fantasias, improvisadas, não resistem a mais de um uso; as peças de mobiliário se extinguem com a velocidade de a moda.
Nada mais é feito para durar, nem as lembranças. As informações vão ocupando – e se renovando contínua e velozmente- todos os cantos disponíveis das memórias, humanas e tecnológicas. A vida é um contínuo presente. O passado já passou. O futuro será sempre presente.
No passado, além de as lembranças, ficaram os sentimentos por experiências vividas, testemunhadas pelos trechos amarelecidos pelo tempo, que um simples Del não conseguiria apagar.
Nada mais há para ser guardado, nem lembrado, nem visto, nem sentido.
É mais sensato deixar o baú onde sempre esteve, um lugar que não existe mais, no passado.