terça-feira, 19 de maio de 2015

CASAMENTO ABERTO


(Publicado no JG, Jornal de Gramado, em 14/05/2015)

“O homem não morre quando deixa de viver, mas sim quando deixa de amar.”
                                                                                                                Charlie Chaplin

Por Sandra Freire
Mais uma vez, volta à baila esse tema. Desde Sartre e Simone, várias investidas para fazer valer essa teoria, têm sido feitas por casais mundo afora. A ideia, sedutora sem dúvida, tem como principal objetivo, domar o monstro ameaçador de uniões que adotam um modelo tradicional, tipo “Felizes para sempre”. Ilusório ou não, pessoas em variadas fases da vida estão se lançando nessa nova experiência. Mas, cuidado. Os exemplos famosos não foram tão felizes, fora que, apesar de artistas e intelectuais, deixaram expostas suas raízes mundanas.

Amores Modernos, recentemente lançado, o livro de Daniel Bullen volta a mexer em vespeiro. Não podemos nos iludir e pensar que o comportamento libertino adotado por alguns casais de um círculo tão fechado quanto o de intelectuais, seria aceito sem reservas na nossa sociedade.

O modelo casamento indissolúvel, de vez em quando é ameaçado por tentativas de alterações dos seus dogmas. Algumas inserções são feitas e “aceitas” sem problemas. O futebol semanal, o chopp com os amigos e as reuniões fora do horário comercial, já fazem parte do cardápio de alguns. São conquistas tão fortemente incorporadas à convivência de um casal, quanto a dor de cabeça das mulheres.

Há de se considerar que em tempos de crise, a tendência é mais para manter a união, do que para a dissolução, mesmo que esse ponto não seja exatamente a questão de um determinado par.

Portanto, a moda do casamento aberto, por pouco que seja, pode trazer um refrigério à cela que se fechou com a feliz união e ameaça sufocar os que lá estão. Mais liberdade para as borboletas. Dias de saída combinadíssimos. Tudo em nome da harmonia em torno da família constituída.

Talvez essa seja uma solução mais honesta até para que reflexões sobre a vida a dois possam substituir a inútil e mofada “Discutir a relação”.

Na infância, somos monitorados por tempo integral. Na adolescência, ansiamos por ter mais liberdade, o que leva o adolescente a curtir menos essa fase e desejar alcançar logo a idade adulta. Na fase adulta, nos “amarramos” a outra pessoa. Ou seja, desejamos ter liberdade e quando a alcançamos, tornamos a abrir mão dela- muitas vezes sem convicção.

 A aceitação de regras impostas a uma feliz união embota o bom senso dos pares. Os dois passam a ter certeza de que são indispensáveis para a sobrevivência emocional do outro. O filme “Vida de Casado” aborda a questão com muita sensibilidade.

Melhor seria convidar o bom senso ao debate. O fato de termos representado muito para alguém, não acarreta um compromisso vitalício. Quando isso é encarado com honestidade, surge a oportunidade para que os dois encontrem um novo caminho.

Cada casal é único. Não há regra que se aplique a todos. Uns são felizes dizendo que são. Outros são felizes, mesmo sem dizer.

quinta-feira, 7 de maio de 2015

A TERCEIRA PESSOA




“Existe um lugar onde ninguém pode tirar você de mim. Este lugar chama-se Pensamento... e nele, você me pertence!!”
                                                   Charles Chaplin


Sandra Freire
Quando inadvertidamente somos atraídos por alguém, imediatamente colocamos essa pessoa, como um croqui, numa tela e a transformamos no nosso ser ideal. Se, entre a atração e a realidade houver tempo para os retoques finais, nosso trabalho terá operado a mágica de transformar um trabalho acadêmico, sem grandes pretensões, numa obra-prima.
Terá surgido a “terceira pessoa”. E, só entre você e ela pode se estabelecer uma conexão.
É assustador pensar que podemos estar fazendo parte da vida de outra (s) pessoa (s). Assim, sem licença. Aquele que nos aprisiona em seus sonhos decide o nosso destino. Pode nos conduzir a qualquer lugar. Pode decidir se somos felizes ou não. Pode nos emprestar outra identidade e até outra aparência. Quando habitamos os sonhos de alguém, perdemos o controle de nós mesmos.
Podemos estar vivendo outra vida, como os personagens de uma trama. Essa outra realidade pode estar se passando num outro plano. Há todo um contexto que faz com que esse outro cotidiano seja parecido com o real. Emoções são experimentadas, situações são vividas, outras pessoas compõem a cena. Nossa personalidade é adaptada aos desejos daquele que nos aprisiona.
Tudo isso pode parecer irreal, até que nosso tutor se revele. Tomar conhecimento de que realmente temos estado noutra cena, paralela a real, desperta curiosidade e vontade de “entrar no jogo”. Jogo cujas peças moldadas pela imaginação de outrem, pode se configurar de forma indesejada. A imaginação não tem limites e não corre riscos. Difícil, muito difícil, é deixar esse mundo paralelo na sua dimensão. Visitá-lo, vivenciar seu cotidiano, se comprazer. Depois, simplesmente fechar a porta e voltar à realidade.

Realidade essa que tem de oferecer elementos sedutores capazes de competir com o outro mundo.